quarta-feira, 16 de novembro de 2005

Estará a Europa fora de moda?

Isto passou-me pela cabeça algures no primeiro ou no segundo encore dos Young Gods na Aula Magna, há alguns dias. Os Young Gods, suíços, vieram cá celebrar os 20 anos de carreira. Meses antes, os Einstürzende Neubauten, alemães, trouxeram ao CCB a digressão dos 25 anos.
A menção à naturalidade destes dois grupos é intencional. Recuando alguns anos no tempo -- não é preciso ir muito longe, até porque há vinte ou há vinte cinco anos não era mais do que uma criança a quem a música pouco ou nada dizia --, e recordando o panorama de então, tínhamos que o rock independente que cá chegava era essencialmente de origem europeia. De Espanha, ou melhor, da Galiza, chegavam-nos os Resentidos com o seu "Fai un Sol de Carallo"; de França, os Indochine e os Mano Negra; da Bélgica, os Front 242; da Irlanda, os Virgin Prunes (e até, de certa forma, os U2); da Escócia, os Jesus and Mary Chain; da Inglaterra, um número infindável de nomes, como sempre aconteceu; da Alemanha, e além dos Neubauten, apareciam também muitos outros nomes, como os Sprung Aus den Wolken; até mesmo da antiga Jugoslávia chegavam cá os sons de grupos como os Laibach. Poderíamos estender esta lista a praticamente todos os países da Europa e até imaginar um festival eurovisão da canção alternativa...
Não é que não chegasse cá o que se fazia além Atlântico. Os nomes de grupos como os Sonic Youth, os Melvins, os Cramps, os Dinosaur Jr., entre outros, ecoavam por esta terra em circunstâncias semelhantes às dos que já foram citados. E ainda bem.
Mas se olharmos para o panorama actual, fica-se com a sensação que algo aconteceu na nossa velha Europa. Será que a única coisa que existe, além de meia-dúzia de estranhas bandas que persistem em comemorar décadas de carreira, são fenómenos passageiros essencialmente ligados à electrónica? Ou será que o que efectivamente mudou foi apenas a forma como olhamos para esta Europa ou, melhor, de como deixámos de olhar para ela? O que não vemos é como se não existisse?
No passado, antes da internet, os canais mediáticos que tínhamos ao nosso dispor, e que neste contexto de rock independente compreendiam essencialmente o Blitz, o NME, o Melody Maker, as fanzines locais e uma ou outra revista de referência internacional, eram naturalmente euro-centristas. Hoje, as principais publicações de referência são norte-americanas, com especial evidência para os verdadeiros criadores de micro-cenas e micro-hypes (na base de grandes fenómenos posteriores, muitas das vezes), que são os sites de vanguarda como o pitchforkmedia.com, o tinymixtapes.com ou o stylusmagazine.com, entre outros. Para reforçar a ideia que o centro dos acontecimentos está definitivamente do lado de lá, as agendas das próprias publicações europeias estão cada vez mais subordinadas às novidades que derivam dos canais de divulgação acabados de citar, não conseguindo ter a mesma eficácia na divulgação dos fenómenos locais.
Em suma, a música feita na Europa -- excluindo, como se compreende, o Reino Unido -- poderá estar a sofrer da mesma incapacidade de ser reconhecida que, a um plano mais micro, a música portuguesa sofreu desde sempre fora de fronteiras. Não é nenhuma mentira que, ao longo de todos estes anos, foram muitos os projectos e até mesmo algumas "cenas" portuguesas que não teriam morrido quase à nascença, se tivessem logrado obter maior interesse mediático lá fora. Como se se interrogava mais acima, o que não se vê é como que não exista. Olhando para o panorama actual, parece que este "handicap" adquiriu contornos europeus.
Não há, neste raciocínio, qualquer intenção de minorar a relevância e a qualidade da maioria dos músicos e fenómenos com origem do outro lado do Atlântico. Existe apenas a constatação de que dificilmente se reunem hoje as condições para nascerem outros Young Gods...

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